domingo, julho 10

Visitando Alma Negra en sua belissima embarcación - Parte IV de IV

Diário de bordo
do Capitão Salazár
do navio Las Hermanas
Dia 3

Partimos

Quando volto à embarcação, com os limões e pães, Alma Negra está preocupado com um comentário de nosso ultra-biólogo:

“Suas unhas estão brancas demais”
As unhas brancas de Alma Negra.

- E o que pode ser isto, señor Almeida? - pergunta-lhe Alma Negra.
- Excesso de zinco, e alguma outra coisa - responde ele, cortando um pão.

Posso notar que, apesar de ser o mais pirata de todos nós, Alma Negra é um pouco vaidoso, abrindo de vez em quando o armário e passando cremes nas mãos, entre outros hábitos paniqueños. Porque trabalha com a população.

- Mas sempre foram assim, Dom Ortis! - diz Alma Negra, assustado com as unhas.
- Será mesmo? - indaga Ortis.

Alma Negra, desse momento em diante, sempre a conversar conosco olhando as próprias mãos. Dom Ortis e Dom Villa, como siempre - laricándo.
Estou espalhado em uma cadeira de madeira, observando um belo espelho de Sol e Lua. Talhados em uma madeira escura.

Saborosa limonada cura nossas ressacas - não me sinto mais um cadáver.
Levantamos todos e nos despedimos de nosso amigo.
Obrigado pela visita, capitães - diz Alma Negra, saudoso.
E neste momento, digo-lhe a frase que vim pensando no caminho para a Baía de Gabanha, pousando-lhe a mão sobre os ombros:

- Meu amigo, a sua vitória é a nossa vitória!

Dom Salazár

Visitando Alma Negra en sua belissima embarcación - Parte III de IV


Diário de bordo
do Capitão Salazár
do navio Las Hermanas
Dia 3

Acordado

Salazár está derrentendo. Derretendo muito. A única coisa que pode guiá-lo agora são as luzes.

- Nunca fui tão humilhado em toda mi vida, maricones de miérda! - grito alto para que todos ouçam. Estão me segurando para que eu não faça besteiras. Estou lunatizado e confuso.
- Se acalme, Salazár. Maldição! - diz Ortis, a me dar tapas na cara.
Acordo, no barco de Alma Negra.

Estou passando mal com tanta tequila. Deixando as vísceras na sanita. Alma Negra também, um pouco depois. Fazemos sessões alternadas no banheiro. Porque bebemos a garrafa toda, em dois.

Dormimos os quatro em uma cama improvisada. Todos dormem mas não consigo.
Estoy muy acordado, brincando com o caco de vidro em meu pé esquerdo e olhando as estrelas. Aquele tipo de coisa que se faz quando todos os outros dormem. Olhando no céu a mesma lua que ela. Ao meu lado vejo as faces grotescas de piratas no sono, com suas bocas abertas de poucos dentes e barbas babentas e roncos de porcos. Me incluo nisso.
Quisera eu estivesse Maria Salazár no lugar deles. Estaria dormindo melhor, envolvido em seus graciosos e aconchegantes tentáculos.

Logo, ao amanhecer, constato:

Como acordar Dom Ortis:

Efeito algum se obtém ao jogar-lhe uma coberta em cima de sua carcaça.
Acendendo, entretando, un vierde matinal, desperta imeditamente, a perguntar:
- Mas que cheiro bom é este?

O fantasma de Juan Lenóm, no quadro da parede - grande trovador lendario - começa a derrubar coisas da mesa. Parece que passei pelo ritual de iniciação noite passada.

Desco ao cáis, para a cidade. Para buscar uns pães e limões, para as nossas ressacas. Vejo velhos estranhos, que me confundem, com seus pedidos.
- Por favor, abra esta porta para mim, meu jovem. Não, não é para abrí-la assim. Apenas abra esta porta. Ando entre os malucos de rua e compradores de ouro. Não tão diferentes de nós, os primeiros.

Somos malucos do mar.

PS.: Como acordar Dom Villa:

Traga comida cheirosa e ponha na mesa.

Dom Salazár

Visitando Alma Negra en sua belissima embarcación - Parte II de IV

Diário de bordo
do Capitão Salazár
do navio Las Hermanas
Dia 3

Provocações

Alma Negra e eu brindamos com sua tequila - depositada em um dos vasos orientais. E ficamos nesta frequência, a noite toda. Até que surge um novo Dom Salazár, sempre a andar cheio de lágrimas nos olhos. Creio que o sal do mar tenha invadido meus glóbulos, ou a fumaça parada dos charutos no ar, tenham me causado irritação nos mesmos.

- Posso pôr? - pergunta Alma Negra, com a garrafa em meu copo. Mas já estou vendo coisas onde elas não existem.
- Quieres por o que en mim, maricón de mierda? - esbravejo, irritado e vermelho.
- Macacos me mordam! - exclama Alma Negra.
Todos rindo de minha reação.
Soy Dom Juan Salazár, el bebado confuso.

Dom Villa siempre a comer todo o tipo de coisa. Parece que está viciado em prazer.
Alma Negra lhe dá intruções de como comer azeitonas:
- Não precisa comer os caroços, Pedro - e todos se matam de rir. - E outra coisa, quando acabar não precisa beber esta água - continua ele.
- Não queria sal, señor Pedro? - digo a ele, no que estamos com as barrigas doendo de uma série de gargalhadas doidas.
Alma Negra nos conta depois que estava passando com as azeitonas e viu que Pedro as olhava, com desejo. Foi a obrigado a parar ali e oferecer ao monstro insaciável.
Risadas sem fim.

Os homens do mar se divertem assim. Provocando uns aos outros. É preciso no entanto, o equilíbrio. Saber distinguir as brincadeiras de reais ofensas. Pois no fundo são todos amigos. Parece que esta noite Dom Salazár esteve bastante confuso sobre tudo isso. Chegou a tentar ir embora quando as provocações recairam todas sobre ele, durante um bom tempo da noite. Ele estava bêbado e lunatizado, e os outros brincavam com sua confusão.

Proponho a Alma Negra que façamos um pouco de música. De repente, não estou mais em seu barco. Estou sozinho, num palco empoeirado, com meu violão. Tocando as músicas de meu coração para a platéia vazia de um bar. Alma Negra está no fundo, de braços cruzados, a repetir que odeia a música lunar. Prefere, sem dúvida, as marítimas. Escondido atrás da porta, atrás de mim está Dom Villa, para me atacar de soslaio. El torero paniqueño me atinge com seus espetos. Caio no chão, sangrando. Os olhos queimando do sal do mar. Talvez ele esteja chorando - dizem os outros, sobre mim. Dom Villa me põe numa mesa e me prepara como jantar. Com maçãs e pimenta. Cortando-me os braços e pernas. Enfiando farofas de tempero em minha barriga aberta. Mierda, esta noite Dom Villa irá se fartar de minha carne temperada. Ele e os outros gordos deste barco.

Dom Salazár

Visitando Alma Negra en sua belissima embarcación - Parte I de IV

Diário de bordo
do Capitão Salazár
do navio Las Hermanas
Dia 3


No Porto de Gabanha

Se Alma Negra não vem até nós, vamos até Alma Negra.
Há alguns dias atrás fomos visitá-lo em seu barco. Todos nós, com excessão de Galagueñas, sempre com suas coisas. Mas que bela embarcação, realmente a sua cara. Agora sim está em casa: Tapetes vermelhos e quadros na parede. Mas que bom gosto tem este Alma Negra. Traz de suas viagens pelo mundo artefatos exóticos, espalhados pela casa: borbulhadores, vitrolas, vasos orientais e outras coisas mais.

Atravessamos os três rios para chegar no Porto em que está atracado. Próximo à Baía de Gabanha, grande centro comercial. No caminho, conhecemos um conterrâneo de Alma Negra, também navegante, que conversa conosco demoradamente sobre a boa música. Desconfio que o bom gosto musical seja uma constante entre os originários destas terras.

Esperamos no cáis até que ele nos encontra, fazendo-nos cumprimento na aba de sua boina. Está diferente - cabelos queimados do Sol, quase loiros. E um sorriso nas faces.
Passamos em um armazém para pegar bebidas. Dom Villa, descontrolado, a comprar uma infinidade de doces para sua grande barriga. Também queria levar um pacote de sal - sabe-se lá para quê.

Chegamos ao barco de Alma Negra. Todos olhando seu interior. A vista para o porto é fantástica. O porto de Gabanha é o mais movimentado que já vi. Centenas de pessoas transitando, com seus mascates e cavalos. Vasos de plantas pintados de vermelho nas esquinas.
Dom Alma negra sempre nos dando novas visões.

Desde que entramos posso notar um fenômeno muito interessante: somos três amigos de Alma Negra - isto é certo - mas nossas afinidades com ele são diversas.
Dom Ortis conversa com ele sobre charutos jamaicanos. E conversam sobre isso por horas, animosamente.
Quanto a mim, Dom Salazár, gosto de conversar sobre música com este trovador de los bares da noche.
Dom Villa e ele conversam sobre outras coisas, mais engraçadas. Não consigo identificar muito bem os temas mas, em geral, envolve sempre a seguinte situação:
Alma Negra caçoando da gula de Dom Villa e este rebatendo que Alma Negra também é un gordo. É engraçadíssimo.

Alma Negra nos pôe música em sua vitrola.
- O que aconteceria se faltasse eletricidade aos aparelhos? - pergunto a ele. - ficaríamos sem música?
E ele, sabiamente, me responde que os trovadores iriam se juntar e começar a tocar alguma coisa. Mas é claro, como não tinha pensado nisso? Estamos sempre a fazer música e não precisamos de gravadores necessariamente. Estava eu apenas a insistir na idéia das vitrolas à manivela, que nunca falham. Estou paranóico com a idéia de faltar-nos música.

Dom Ortis procura um pouco de óleo para que Dom Villa frite seus pastéis. De acordo com Alma Negra são risolles. Cigarros típicos da região de Villa. Parecem-me mais uns burritos.